domingo, 3 de junho de 2012

Re-tros-pec-to


Despertei. Quando abri os olhos, olhei em volta sem reconhecer nada. As mesas brancas que se encaixavam perfeitamente nas quinas da parede eram cobertas de flores coloridas e livros empoeirados. A cama tinha um cobertor amarrotado e no banco ao lado um café quente.
Me sentei. Precisei de alguns segundos de realidade para me desligar do sonho. Aquele, que tive com você. Não bastasse as diárias perdidas com o pensamento agarrado em você, as poucas de sono que me restavam você invadia. Não era justo.
O sol, tímido em um dia nublado, tentava atravessar as persianas azuis e acertar em cheio meus olhos, transbordando de lágrimas.
Uma delas caiu no lençol laranja, e fez uma mancha tão grande. Aquela maquiagem pesada da noite anterior tava toda ali, ainda. Aos poucos a consciência voltou.
Tinham sido três gostos naquela semana. Não queriam mesmo ir embora, e se fizeram presente em todos os dias dela: vodka, café e lágrimas.
Me atingiam em diferentes momentos. Mas você, estava sempre ali.
Quando me levantei da cama, cambaleei. A mesma vontade que gritava de dentro de correr e ir atrás de você, se contradizia com a inércia do corpo, que só queria dormir e ficar ali, jogado nos pensamentos seus.
Enquanto não resolvia, senti o braço arder. Lembrei. Aqueles cortes tinham ficado sem curativo, e eu estava tão exposta quanto eles.
Minha mãe interrompe a confusão, abrindo a porta. Ela me viu chegar em casa, acabada daquele jeito, então não precisava ter receios ou esconder nada. Simplesmente fiquei em pé, parada.
Ela me abraçou e disse:
-Sabe, filha. O coração é o único que dá a vida e a morte. Ele tem vida própria. Com ele, a gente não deve nunca discutir.
Me deu um beijo na testa e saiu, acendendo um cigarro.
E eu fiquei, ali. Com o gosto de ontem, querendo sentir o de amanhã.


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